Ok, você não sabe quem é Tina Fey e não quer saber sobre a sósia dela, mas não vá embora do post ainda. O texto tem plot twist e já, já, você vai entender como você tem tudo a ver com a comediante, mesmo que não se interesse pelo trabalho da moça e não tenha a mínima intenção de ler seu livro. O post ficou grande porque comenta de uma vez um livro, um filme, como eles se relacionam entre si e como se relacionam com você aí do outro lado. Eu gostaria muito que você lesse até o final porque no início pode parecer bobo, mas acredite em mim, você vai ver como tem uns debates muito sérios através do post.
Tina Fey
Uma vez em cada geração uma mulher surge e muda tudo. Tina Fey não é essa mulher, mas ela conheceu essa mulher uma vez agiu esquisito perto dela.
Elogios para Tina Fey:
“Você ficaria muito bonita se perdesse peso” (Namorado da Faculdade, 1990)
“Tina é um troll feio, com formato de pêra e superestimado” (A Internet)
“Mãe, cadê os pretzels?” (Tracy Morgan)
Elogios para Bossypants:
“Eu espero que essa não seja a capa de verdade. Isso vai prejudicar as vendas” (Don Fey, Pai de Tina Fey)
“Absolutamente delicioso!” (Um cara que come livros)
“Vale muito a pena” (Árvores)
“Não imprimam essa linda recomendação do livro de Tina Fey antes que eu esteja morto há 100” (Mark Twain)
“Hilário e perspicaz. Muito engraçado – ah, não, uma lua cheia. Não! Arrgh! Saia de perto de mim! Save-se!” (Um cara virando lobisomem)
Com essas recomendações pra lá de confiáveis, eu não pude evitar comprar o livro da minha ídola da TV, Tina Fey. Mas, se você não faz a mínima ideia de quem seja ou não entende o meu fascínio por ela a ponto de comprar o seu livro, eu explico.
Porque eu gosto tanto da Tina Fey
1.Ela é inteligente genial
Responsável pelos roteiros de Meninas Malvadas e produtora de 30 Rock, Tina consegue entregar sempre textos afiados, desafiadores, que falam de coisas sérias sem se levar tão a sério assim. A gente sempre fica com a impressão de que estar vendo um episódio mais genial que o outro.
2. E nerd
Fã incondicional de Star Wars, não perde a chance de usar a saga jedi em seus projetos (Não que eu realmente me importe com Star Wars) e em Meninas Malvadas inseriu toda uma trama com matemática que por muito tempo foi tema de piadas internas entre meus amigos, principalmente quando todo mundo começou a estudar cálculo e descobriu o que era limite e que ele existia, sim senhor. Tina tem aquele ar de nerd rejeitado e modesto, que, apesar do seu potencial, ainda se sente meio esquisita tirando fotografia pra capas de revista e se pudesse ficaria no sofá o dia inteiro de moletom.
3. E engraçada
Ao contrário de muitos comediantes por aí, Tina Fey é engraçada de verdade. Ela não precisa fazer nada que eu já tenho vontade de rir. Adoro quando ela fala alguma coisa mas dá pra perceber que ela está maquinando milhares de outras coisas piores que não vem a público. E ao contrário de muita gente que faz piada denegrindo os outros, uma das maiores virtudes de Tina é tirar sarro de si mesma e sem apelar para baixaria.
4. E parece com a Meg
O senso de humor, o jeito de falar (e de parecer maquinar outras coisas piores enquanto fala), o apreço por Star Wars, o vício de inserir milhares de referências pop por segundo, a veia feminista... Tina Fey é a Meg Cabot da TV.
5. E parece com a minha profª de português do ginásio
Tá legal, você não conhece a professora. E talvez elas não se pareçam mesmo. Mas às vezes eu olho pra Tina e lembro um pouco da Tia Deborah. Eu falei dela (Tia Deborah) e dela (Tina Fey) aqui várias vezes. Os óculos, o olhar míope quando está sem eles e o formato do rosto parecem um pouco. Mas o pior é a personalidade que parecia mais ainda! As tiradas no meio da aula, o jeito insano como funciona a sua cabeça... Acho que eu preciso procurar um psicólogo, sabia? Quase todo mundo na TV me lembra a Deborah! Se bem que na verdade ela tem um semblante bem comum. Talvez eu não esteja tão maluca assim.
Como esperado, Bossypants é engraçado, com piadas que vão desde a orelha do até os agradecimentos, piadas de riso de canto e outras genais tipo “Não vou mencionar o nome dele aqui, mas se você quiser mesmo saber, as letras estão espalhadas por essa página”.
Mas ao seu final fiquei com a sensação de que podia ser melhor. Em parte por culpa minha que não tenho o inglês avançado o suficiente para acompanhar o humor calcado em gírias e expressões idiomáticas de Tina e não possuo o nível de cultura pop necessários para entender algumas piadas. E em parte por culpa do livro também que parece sofrer de falta de foco narrativo no começo e só começa ficar bom mesmo a partir da parte em que Tina passa a narrar os fatos relativos ao começo de sua carreira como comediante.
Como ia dizendo, o livro só fica bom mesmo quando Tina envereda de vez no caminho da comédia em sua vida. Ela entra para um grupo de teatro em que conhece sua best Amy Poheler (outra diva da comédia), o produtor do Saturday Night Live, Lorne Michaels* e o livro ganha ares de bastidores da TV, assim como a aclamada série comandada por Tina Fey, 30 Rock. (Para quem não sabe, 30 Rock é “sobre” os tempos em que Tina era roteirista do SNL. A primeira mulher, inclusive a fazer parte da patrulha. E qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência, é puro descaramento mesmo).
* O SNL - que recentemente ganhou uma versão brasileira que vai ao ar aos domingos (!) liderada por Rafinha Bastos - lembra muito o antigo Casseta e Planeta com sátiras políticas e paródias musicais, mas nos EUA passa nas noites de sábado, que, por aqui é horário do Zorra Total. E nesse contexto acho muito digno dizer que Lorne Michaels seja uma espécie de Maurício Sherman da produção estadunidense, responsável por garimpar novos nomes para o programa e renovar o elenco de tempos em tempos.
De fato há alguns capítulos que falam dos bastidores do SNL e outros em que é possível reconhecer algumas tramas já usadas em alguns episódios de 30 Rock como aquele da jarra de xixi (putz, como esse episódio é nojento!) e o mesmo humor auto-depreciativo de Liz Lemon (e se você até agora não tinha sacado, Liz Lemon é uma versão da própria Tina). Todos os capítulos que tratam sobre o dia-a-dia da TV são ótimos, com destaque para o tempo em que Tina começou a encarnar a candidata a vice-presidente dos EUA, Sarah Palin (mais sobre ela depois) e se viu no meio de toda a corrida presidencial.
(Vale destacar inclusive que o livro tem uma linguagem bastante televisiva, apelando às vezes para gráficos e fotos, e muito parecida com a utilizada em 30 Rock, com flashbacks-relâmpagos a todo momento e piadinhas do tipo piscou-perdeu - e como eu já confessei, eu pisquei à beça. Talvez esse vício de TV também seja o responsável pela falta de foco narrativo que me incomodou tanto no início também.)
Além disso, vale mencionar o capítulo da lua-de-mel em que ela escolheu passar num cruzeiro porque o marido tem medo de avião e acabou que o cruzeiro que quase afundou e teve que voltar de avião pra casa (a história é ótima mesmo e o comentário final sacaneando Titanic é ainda melhor!), o capítulo que conta seu encontro com Mônica Lewinski (sim, aquela do Bill Clinton) e os capítulos que satirizam o ideal de beleza da mídia e discutem um pouco de feminismo. Há uma parte em que ela tira sarro da vida de estrela sexy que tira fotos para capas de revista (aqui Tina desenvolve uma argumentação muito legal sobre Photoshop), outras em que ela finge dar dicas de beleza, e algumas discussões sobre ser uma mulher/comediante e mãe que trabalha fora.
Tina termina o livro emparelhando passado e presente e refletindo acerca de “ter ou não ter” outro bebê. E isso que eu acabei de contar NÃO É spoiler. Spoiler de verdade é saber que em agosto de 2011 ela deu à luz uma menina chamada Penélope Athena (mais grego impossível!).
Sua sósia
Como comentei, um dos destaques do livro é a parte em que Tina conta detalhes sobre os bastidores da imitação de Sarah Palin, a reação do público, o jeito como ficou famosa só porque parece com a mulher (e faz a voz igualzinho!) e passou a aparecer não só nos programas de humor mas também nos canais de notícia tipo CNN, como ela não queria se meter nos rumos da eleição apesar de tudo isso e até um breve encontro com a própria, quando ela foi convidada do SNL.
Aí outro dia passou na telinha Virada de Jogo, um filme feito pela HBO sobre as eleições de 2008 e como a trajetória de Sarah Palin mudou os rumos da campanha republicana. A governadora do Alasca aqui é interpretada por Julianne Moore e não por Tina, e numa excelente atuação a atriz interpreta a personagem com muita dignidade e respeito, sem deixar de incorporar os trejeitos da candidata e sua vozinha irritante que por si só já são engraçados e não precisam estar dentro de uma esquete para fazer rir. A mulher é muito comédia!
Num cenário em que Obama liderava as pesquisas com folga, a assessoria de John McCain foi buscar no “grande estado do Alasca” um ingrediente que traria novas ideias e novos eleitores para a campanha: Sarah Palin. Mulher, conservadora, com visão independente (leia-se "com imagem afastada do governo Bush") e dona de um imenso carisma, Sarah realmente trouxe muitas doações, eleitores e a atenção da mídia que os assessores queriam. O problema é que ela também trouxe muita dor de cabeça porque a atenção que recebia às vezes era pelos motivos errados.
Foram inúmeras polêmicas envolvendo filhos que não seriam dela, a gravidez da filha adolescente e principalmente sua falta de conhecimento de política externa. O filme chega a insinuar que ela havia confundido os atentados de 11/09 com a guerra no Iraque e que não sabia que quem manda na Inglaterra não é a rainha. Em determinados momentos, Tina Fey até aparece no filme zoando a candidata se assistindo na TV, como no famoso diálogo de abertura que fez com Amy Poheler em que satiriza uma entrevista de Palin na qual a governadora dá a entender que EUA e Rússia são vizinhos. O tal diálogo (hilário, diga-se de passagem) está descrito na íntegra no livro, aliás. “Eu posso ver a Rússia da minha casa”, zoava Tina.
Apesar disso, o filme não tira sarro de Sarah Palin e a retrata como uma mulher forte e carismática que apenas foi vítima das conseqüências. Quer dizer, num dia ela estava lá na casa dela cuidando das crianças, resolvendo os problemas locais do seu estado, no outro estava em rede nacional para todo o país (e para todo o mundo até) tendo seu passado vasculhado e respondendo perguntas sobre as quais não fazia a menor ideia.
O mundo todo se perguntou: “COMO É QUE PODE UMA MULHER DESSAS SER CANDIDATA A VICE-PRESIDENTE? Imagina só se o McCain é eleito e morre! Ela não tem condição nenhuma de governar um país!”
E aí é que você, que achava que não tinha nada a ver com a história, entra no meio de tudo isso.
Você no meio das duas
Num primeiro momento, Virada no Jogo pode até contar a história da corrida presidencial estadunidense de 2008, mas numa análise um pouco menos superficial é fácil perceber como ele fala de como funciona a máquina da política como um todo e como ela é capaz de manipular as pessoas sem que elas sequer percebam. E isso você pode aplicar nas próximas eleições municipais que estão por vir.
A seguir “3 Lições que Aprendemos com a história da Sarah Palin”:
1) Em eleições, quanto mais polêmica melhor
Eleição é a maior baixaria. Os candidatos têm sua vida particular revirada, um monte de mentiras são inventadas, boatos espalhados e no fim das contas o que menos se discute é política. Tudo vira uma disputa de popularidade vazia que em alguns momentos chega a lembrar um paredão do BBB. Nos EUA, os candidatos fazem campanha disfarçada em talk shows e programas de humor. No Brasil, o humor fica no horário eleitoral gratuito mesmo.
2) Só confie no argumento “De Mulher pra Mulher” se for comercial da Marisa
Em alguma parte de Bossypants, Tina Fey comenta sobre a diferença entre homens e mulheres na comédia (que é nenhuma!) e como, depois de ter ouvido de alguns diretores que o número de mulheres em esquetes deveria ser restrito, seu sonho na verdade era com o dia em que homens e mulheres pudessem disputar em pé de igualdade, utilizando-se do argumento de quem era mais engraçado.
O mesmo pode ser aplicado na política. Na ânsia de “roubar” o eleitorado feminino que apoiava Hillary Clinton nas prévias contra Obama, Sarah Palin foi escolhida às pressas principalmente porque era mulher. E não porque era boa. E seu “fracasso” se deve não ao fato de ser mulher, mas sim porque não estava preparada o suficiente. Ou melhor, porque ela não PARECIA estar preparada o suficiente (mais sobre isso depois).
E, sim, agora temos uma presidente, quer dizer, presidenta também que, no caso, se elegeu por causa do carisma de seu antecessor. Mas há um pouco mais de 10 anos, quase tivemos uma candidata com intenções de se eleger às custas do rótulo: "Vote em mim porque sou mulher". A senhora em questão era Roseana Sarney, filha do senador que todo mundo hoje quer ver fora do congresso mas continua votando para que ele se reeleja, e não fosse a descoberta de um escândalo da SUDAM talvez tivesse até chegado ao Palácio do Planalto.
3) Em eleições, mais importante do que saber é parecer que sabe
Mas, é claro que, além do “Fator Feminino”, Sarah também foi escolhida pelos ideais que representava e por incomensurável seu carisma. Os republicanos precisavam de alguém que fosse uma estrela de cinema assim como Obama (ou como o nosso Lula). E conseguiram! A mulher roubou a cena e ganhou até filme!
O problema é que ela deixou transparecer que “tinha faltado a algumas aulas de geografia”. Ninguém é obrigado a saber tudo. Mas espera-se que alguém que vá ocupar um cargo de tanta responsabilidade saiba o que está fazendo e não dê vexame. Acho até que todo mundo é capaz de aprender. O Brasil mesmo teve um presidente que não terminou nem o fundamental e fez um bom trabalho. Na política (e até na nossa vida mesmo), muitas vezes não precisa SABER de verdade. Mais importante é PARECER que sabe.
É claro que no caso do Lula todo mundo sabia que o cara não tinha muita instrução. Mas quantos mais políticos vocês acham que se elegem sem a formação necessária? E eu nem estou falando dos casos mais extremos tipo Tiririca, porque, se você for ver mesmo, nenhum deles está preparado de verdade para o cargo. Estamos votando no escuro o tempo todo, baseados apenas no carisma dos candidatos!
Aí você pensa: “Ah, mas para os cargos do poder executivo, a gente pelo menos pode avaliar os candidatos nos debates!”. Debate pra quê? Até os livros de história já contam sobre a edição pela Globo em favor do Collor em 1989! E mesmo que não aconteça mais esse tipo de coisa, de nada adianta você achar que vai conhecer melhor um candidato, quando na verdade o que aparece na TV não passa de um cara que foi devidamente adestrado para repetir sobre os mesmos temas a toda hora!
Em certo momento do filme, quando ficou claro que não seria possível ensinar Sarah Palin a responder as perguntas, os assessores simplesmente a fizeram decorar as respostas e orientaram-na a voltar para um tema que tivesse domínio caso ela não tivesse a menor ideia do que responder! E ela arrebentou no tal debate!
E é claro que essa não foi a primeira nem será a última vez que isso acontece por lá, e vai acontecer (aliás, já está acontecendo!) por aqui diante dos nossos olhos mais uma vez!
Antes do tal debate, Sarah Palin, irritada com tanta gente lhe dizendo o que fazer, grita: “EU NÃO SOU UM FANTOCHE!!!!” É sim, Palin. E o pior é que todos nós somos.