domingo, 30 de junho de 2013

CV e RP

Passei os últimos meses pensando pra caramba. Pensei tanto que deve ter saído até fumacinha da minha cabeça. Coloquei algumas coisas na balança, fiz algumas projeções para o futuro e para todas as perguntas que fiz a mim mesma obtive “Não” como resposta. Relutei um pouco para admitir, mas decidi que do jeito que está não dá pra ficar.

Por um tempo foi legal, mas não dá pra viver refém do seu trabalho. Como se fosse a teoria mauthusiana, a responsabilidade cresce em progressão geométrica ao passo que a remuneração em progressão aritmética. E mesmo que o fosse, existem coisas na vida que o dinheiro não compra.

Senti que era hora de me mexer, e então lá fui eu atualizar meu currículo. E tive uma grata surpresa até. Lembro que quando fui preencher meu primeiro CV, tive muita dificuldade, afinal, o que escrever, quando não se tem experiência? Sempre achei essa história toda um bando de papo furado. E nunca soube mentir, o que torna situação ainda mais incômoda.

Mas com dois anos de auditoria, percebi que nenhuma das qualidades ali mencionadas era mentira. Fiquei feliz em saber como tinha evoluído desde então. E como agora já não é qualquer anúncio que desperta minha curiosidade.


**************************************************************************************************************

Até que uma dessas headhunters me ligou outro dia. Fez aquelas perguntas naturais de o que você faz, onde você está, pra onde você quer ir. Pra começar é difícil pra caramba explicar o que eu faço. Quem não é do meio não faz ideia do que seja. Dali em diante me arrependi das respostas. Podia ter falado a mesma coisa de outro jeito. Estava meio nervosa, fui pega de surpresa, com medo de falar alto e alguém ouvir. Ouvi a mulher rir do outro lado. Logo me arrependi do que disse. 

Tinha esquecido como esse processo de entrevistas e "marketing pessoal" era idiota. Falar com gente que não faz a mínima ideia de quem você é e muitas vezes também não faz a mínima ideia do que é preciso saber para determinada posição. De como nessas horas o "parecer" é muito mais importante do que o "ser". De ter que responder a questões estúpidas envolvendo animais da floresta e ficar à mercê da subjetividade de quem quer que esteja do outro lado.

Percebi que, por mais que muitas coisas daquilo que os avaliadores gostem de ouvir sejam de fato verdade, ainda é preciso muita conversa na frente do espelho pra treinar a lábia e eventuais mentiras. Ou pelo menos verdades menos assustadoras.

***************************************************************************************************************

No meio disso tudo, eu comecei a ler Obrigado por Fumar (já comentei do filme aqui). E sim, o livro é tão legal quanto o filme. Um pouco diferente também. O livro foca um pouco mais nos próprios personagens, na história do cigarro e acaba com um final um pouco moralista, até. O filme é muito mais sobre a capacidade de manipular a verdade e o poder de convencimento de um discurso bem feito do que sobre a indústria tabagista em si.

Acontece que, diante desse meu dilema, passei a prestar atenção nas técnicas que ele usava para defender a indústria do cigarro. E se ele consegue convencer as pessoas de que o cigarro não faz mal à saúde, com um pouquinho de convicção e cara de pau, é possível dobrar qualquer um em qualquer assunto.

Representante do tabaco que abraça crianças com câncer. Nick é desses.

Quer dizer, a propaganda é a alma do negócio. Quantas vezes você já não comprou alguma coisa no trem/ônibus só pelo carisma do vendedor? Esses caras são marketeiros populares. E dos bons! Porque o cara tem que ser muito bom pra discorrer as mil e uma utilidades da "caneta calendário". Não sei o que eles estão fazendo nos trens, sinceramente, quando deviam era estar dando cursos pra gerentes de multinacionais que não sabem nada sobre vendas.

E a bem da verdade é que todo executivo faz um cursinho desses com Nick Nalylor ou com um camelô de sucesso. Porque ao mesmo tempo em que o candidato floreia suas qualidades, quem contrata também enfeita ou esconde os defeitos do empregador para tornar aquela oportunidade mais apetitosa.

**************************************************************************************************************

E no meio disso tudo, tive uma dessas conversas sérias de feedback, conselhos, futuro com uma pessoa que eu admiro à beça. E enquanto ela falava, eu ria comigo mesma porque só corroborava aquilo que eu já tinha sacado algumas semanas antes, por causa do incidente mencionado ainda há pouco.

O conflito incoerente sobre o “ser” e o “parecer”. A sinceridade que em 99% das vezes é vista como qualidade, mas pode ser um empecilho nos outros 1%. A falta de jeito para fazer propaganda de si mesmo. A inabilidade de “fazer social” com gente que não tem nada a ver comigo.

Porque a bem da verdade eu nunca precisei dessa palhaçada toda. E não me fez falta. Porque sou o tipo de pessoa que os atos falam mais do que a boca. E quem me conhece sabe de tudo isso.

O problema é fazer com que as pessoas certas, que ainda não me conheçam, saibam também.

**************************************************************************************************************
Preciso de profissional de RP experiente em ensino de lábia e atenuações da verdade.Favor mandar CV para inutil@nostalgia.com.br 
Obrigada!

Taí, acho que vou contratar o Luke!
Continue lendo...

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Você está ouvindo o povo cantar?

Na época do colégio, História era uma das minhas matérias preferidas. “A História é a ciência que estuda o passado com o objetivo de entender o presente e tentar analisar o futuro”. Essa foi a definição da matéria na minha primeira aula, com o professor André Batalha (“aquele que quase nunca falha”) e da qual eu nunca mais me esqueci. Com uma boa aula de história é possível formar cidadãos com senso crítico e com maior capacidade de análise e consciência política. 

De todos os assuntos estudados, sem dúvida, a Revolução Francesa sempre foi o meu favorito. Porque a Revolução Francesa é o povo na rua, tomando as armas, cortando a cabeça do rei!


É a mudança de todo um sistema absolutista, a retirada da nobreza do poder, a prova de que quando as pessoas se juntam, as coisas acontecem! São conspirações e revoluções e reviravoltas (ugh!) constantes que alteraram a sociedade ocidental para sempre!

Não à toa, a Revolução Francesa é usada como marco para a transição da Idade Moderna para Idade Contemporânea, essa que a gente vive até hoje.

E isso é maneiro demais não só pra qualquer aluno do ginásio, mas para qualquer um que ainda tenha um pouco de esperança de que o futuro pode ser diferente daquele dito “impossível”.

Mas...depois da Rev. Francesa, a verdade é que a matéria de História fica muito chata. Não sei se porque aquele tempo do fim do séc. XVIII tem uma aura romântica que torna a história mais...hmmmm, atraente. Ou se é porque a partir daí que tudo fica muito mais parecido com aquilo que vivenciamos até hoje e desde então não aconteceu mais nada tão grandioso que colocasse as coisas em outro eixo.

No fim do livro, tinha até um quadrinho comentando sobre como alguns historiadores consideram que, após a queda do muro de Berlim, a História acabou. A humanidade teria atingido sua plenitude na conquista de direitos, o neoliberalismo havia vencido, nada mais iria mudar, ninguém precisaria lutar por nada, tudo ficaria estagnado para sempre. Uma visão bem deprimente, se você quer saber a minha opinião.

Mas, pessoalmente, de uns tempos pra cá, estava quase entrando na teoria desses caras. Parei de acreditar nas passeatas. É muita gente sem saber o real motivo de por que está lá e outras que só o fazem para ganhar visibilidade política para então fazer as mesmas coisas quando alcançarem o poder. Essas mesmas pessoas já não são exemplo pra ninguém como estudantes. Que dirá quando forem políticos? E elas estarem muitas vezes defendendo coisas com as quais eu não concordo não ajuda em nada (Marcha da Maconha, sério mesmo?). Trocando em miúdos, no jargão internáutico, essa galera “não me representa”.

Mas essa semana eu ouvi o povo cantar. E eu me arrepiei. Porque achava que a história tinha morrido.

Não vou porque não tenho coragem. Mas fico feliz que exista gente que tenha o bastante pra ir.

Não dá pra dizer que a causa não é justa. Não são só os 20 centavos. São outros muitos 20 centavos acumulados durante anos sem melhoria na qualidade do serviço. Você acha justo pagar quase 3 reais para andar num ônibus quente e lotado? Você acha certo pagar 5 reais pra pegar uma barca que todo dia dá problema?

Só aceita o discurso de que o aumento já foi inferior ao valor da inflação quem quer. O preço da passagem é caro porque os donos das concessionárias de transporte não querem diminuir suas margens de lucro, altíssimas por sinal. 

Obviamente é um negócio muito lucrativo. Por isso as empresas se estapeiam para ganhar as licitações pelo direito de operar uma linha de ônibus ou outro tipo de transporte. Num sistema de monopólio em que não se renova frota, não se faz manutenção nos equipamentos e em que o recebimento é praticamente todo em dinheiro!!!! Imagina só a liquidez dessas empresas! Na hora de embolsar o lucro do ano eles têm recursos. A SuperVia distribuiu mais de 6 milhões em bônus no ano passado. Mas pra investir no sistema de transporte querem ajuda do governo. Que contrato de concessão vagabundo é esse? Como já diriam nossos avós: “Só querem o ‘Venha Nós’, mas o ‘Vosso Reino’, nada, né!”?

Aí vem o prefeito e diz que o preço é justo desde que toda a frota tenha ar condicionado. E aí eu te pergunto: você acha realmente que esse ar vai funcionar? O do Metrô funciona?

O 003, que faz o percurso Nilópolis-Passeio, custa mais de 6 reais!!!! E por esse preço você assume que seja um transporte de luxo, com poltrona reclinável, e todo o conforto do mundo certo? Errado! É uma frota totalmente sucateada, com carros que não passam por manutenção, o ar condicionado não funciona direito e quando funciona fica pingando nos passageiros. O ônibus, claro, vive lotado, pois só passa a cada meia hora. E não bastasse isso tudo, ainda tem que dar sorte de conseguir fazer a viagem inteira.

Essa semana mesmo eu o peguei e o ônibus simplesmente QUEBROU no meio da Brasil. E eu bem queria dizer que é porque a gente está passando por uma maré de azar desgraçada aqui em casa, mas TODA A VEZ que eu pego esse ônibus, ele quebra no meio da Brasil. (Por isso que evito pegar até). E antes que algum engraçadinho venha dizer que o problema sou eu, outras pessoas, que o pegam com mais freqüência, também reclamam das constantes viagens interrompidas.

Fiquei com muita vontade de pegar um pedaço de pau e acabar de quebrar aquele bando de lata velha. É claro que não o fiz, porque sou covarde. Mas não tiro a razão de quem o faz.

Não são só 20 centavos. É a indignação de uma gente que cansou de ver tanta injustiça e não fazer nada. E agora já é a indignação de uma gente que quer sair para as ruas pelo simples direito que tem de sair às ruas.

Sinceramente, a essa altura do campeonato, fico muito chateada com a pequena minoria que ainda insiste em quebrar tudo, mas não dá pra criminalizar uma pichação num ônibus tendo um governo que gasta milhões na reforma no Maracanã para entregar nas mãos do Eike Batista. E você não vai nem ter a chance de assistir nenhum jogo da seleção lá porque os ingressos são caríssimos e o Brasil só entra no Maracá se for pra final.

Sei que é errado, mas parece que só assim seremos ouvidos.

Quis o destino que aumento da passagem se desse às vésperas do início da Copa das Confederações, evento em que o Brasil já ocuparia as páginas internacionais por causa do esporte, mas agora também começa a chamar atenção pelos conflitos do povo, que atendeu ao apelo não planejado de uma propaganda de automóveis, e foi pra rua.

A mídia quer calar os protestos, o governo tira os sites do ar, a polícia reprime com violência e gente vai presa por ter vinagre na bolsa. 

Que democracia é essa? Democracia Chinesa? Pra que Comissão da Verdade se as ordens que vem de cima são exatamente as mesmas de 50 anos atrás? Vamos implantar uma pra investigar a ação da polícia nessa semana também, então!

A diferença é que naquela época as pessoas não tinham internet. E tendo um pouquinho de boa vontade dá pra acompanhar os outros muitos lados dessa mesma história. Aquilo que os grandes noticiários não publicam, aquilo que só quem estava lá sabe.

Não é de hoje que esse tipo de coisa acontece. Não é hoje que isso vai parar de acontecer. 

E ainda bem que não vai. Porque quando essas coisas acontecem é que eu restauro a minha fé na força do povo. E volto a acreditar que o futuro não precisa ser uma grande repetição de indignações vazias. A História está sendo escrita agora. E quem está com a caneta somos nós.

****************************************************************************************************

E daí que enquanto via os manifestantes em várias de nossas capitais, cantando todos juntos, uma coisa linda demais de se ver, eu lembrei de Os Miseráveis. O filme tem muitos problemas de roteiro, a Cosette é chata pra caramba, são passagens de tempo demais (tipo novelas da Globo), não dá pra entender a motivação dos personagens na maior parte do tempo...

Mas se tem uma coisa que o filme consegue fazer é te emocionar. Os números musicais são de arrepiar! 

Em outro ano, acho até que tinha chances de levar o carequinha pra casa, mesmo com tudo isso aí. (Com tanta coisa ruim levando o Oscar nos últimos anos, por que não Os Miseráveis, que, se tem defeitos óbvios, também possui qualidades inquestionáveis?)

Mesmo sendo um musical, baseado na obra de Vitor Hugo, que já tem mais de 100 anos, Os Miseráveis é tudo isso que a gente está vendo pela televisão (e pelo Twitter, e pelo Thumblr e pelo Facebook, e pelo YouTube) hoje. A injustiça, a pobreza, o povo tomando as ruas, a repressão da polícia, Javert infiltrado ali no meio da multidão, o elefante branco ali no meio dos protestos...

E é impossível não ser arrebatado com o canto de um povo, que começa tímido, mas vai ganhando força, e toma as ruas e o som da orquestra sobe e você não tem outra reação senão levantar o braço e cantar junto!

Tenho certeza de que nosso protesto não é só por causa do aumento da passagem. Desconfio seriamente de que tem alguém com interesses escusos por trás de tudo isso. Sei que no final, mesmo após um eventual triunfo do movimento, os “heróis” da causa se tornarão os “vilões” que tanto criticaram e virarão as costas para o povo que os apoiaram. Como aconteceu no nosso passado recente. Como aconteceu na própria Revolução Francesa.

Mas hoje eu quero sonhar. Quero acreditar que a força de um povo tem o poder de mudar o nosso destino. E mesmo sendo covarde quero sentir a emoção de ouvir o povo cantar.

****************************************************************************************************

E aí nessa de escutar a música do filme, fui olhar nos comentários, que a essa altura já tinha gente do Brasil se manifestando por ali, junto com uma galera apoiando os “companheiros” da Turquia. E nesses comentários da Turquia, achei esse vídeo deles cantando Do You Hear The People Sing? durante o seu próprio protesto, com a segunda metade em turco. Se na ficção já era de arrepiar, "quando a batida do coração ecoa a batida dos tambores" na vida real é impossível não se emocionar.

Continue lendo...

sexta-feira, 14 de junho de 2013

Jamie Cullum para as massas

Na mecânica clássica, Momentum é o produto da massa e da velocidade de um objeto. Por exemplo, um caminhão pesado se movendo rapidamente tem um momento maior - é preciso uma força maior e mais prolongada para levar o caminhão a esta velocidade, e também de uma força maior e mais prolongada pra fazê-lo parar depois. Se o caminhão fosse mais leve, ou se movesse mais devagar, então ele teria menos momento.

Já faz sete anos que eu não aprendi essa matéria na escola e Jamie Cullum virou trilha sonora da minha vida. O ano era 2006, a novela era Belíssima, o single era Mind Trick e Jamie Cullum entrou no meu player para nunca mais sair. 

Hoje o ano é 2013 e muita coisa mudou de lá pra cá. Eu já saí da escola, da faculdade e estou procurando uma pós. Ele já tem mais de 30 (quem diria?), casou e agora é pai de duas crianças*. Mas uma das coisas que continuam as mesmas é a capacidade de Mr. Cullum traduzir em música exatamente os dilemas que estou vivendo.

Jamie Cullum, 33 anos sem pentear o cabelo

O novo álbum de Jamie não tem nada a ver com física (graças a Deus!), mas seu significado passa sim pela definição acadêmica do termo. Momentum traz um repertório com muito mais movimento e com letras sobre essa fase da vida em que se tem um pé na vida adulta e outro na juventude (afinal, é do autor de TwentySomething que estamos falando!) e as coisas ganham pesos, importâncias diferentes. O que só comprova a minha teoria de que Jamie Cullum é trilha sonora PRA VIDA.

Dito tudo isso, é com muito prazer que eu venho aqui registrar que Momentum é tudo o que eu sempre quis num álbum de Jamie Cullum. Mais metais, mais pop, mais músicas originais, menos covers só pra agradar os velhos.

Pela primeira vez, me apaixonei à primeira ouvida por um álbum de Cullum. E olha que eu o amo de todo o coração. Mas nunca tinha gostado tanto de um CD dele assim. De querer ouvir a toda hora. De não se decepcionar com nenhuma música. De ser capaz de ouvir todas as faixas sem passar nenhuma.

Okay, eu não gostei de Love for $ale assim que saiu, mas superado aquele rapzinho safado no final – estou pra encontrar alguém que gostou de verdade daquilo - a versão é muito, muito boa, praticamente outra música e em nada lembra a gravação clássica que Jamie já havia feito lá no início de sua carreira.

Mas, sem dúvidas, é seu melhor trabalho já lançado.

E com um potencial radiofônico para conquistar as massas impressionante! O disco está mais palatável, menos experimental, mais pop. Praticamente todas as músicas poderiam tocar numa rádio eclética sem fazer muito esforço. Já me imaginei cantando várias das músicas ao vivo à toda.

Everything You Didn’t Do é o primeiro single e puxa o disco, dando a vontade de ser feliz e fazer tudo o que você sempre quis. Ainda prefiro a versão gravada para o Festival de São Miguel com versos em espanhol, participações especiais, um rapeado hispânico – aqui sim, muito bem colocado -, mas aprendi a gostar dessa versão solo também. O engraçado é que, apesar de, no fundo serem a mesma música, as duas versões têm diferentes significados e impactos sobre mim. Enquanto a primeira, com partes em espanhol, tem clima de festa, congregação de diferentes línguas, povos, culturas e parece um convite a conquistar o resto do mundo, a segunda, solo, soa como uma alerta de que o tempo passa rápido demais para ser desperdiçado, tendo tanta coisa para se aproveitar.


Save Your Soul, Sad, Sad World e You’re Not the Only One simplesmente me conquistaram de um jeito que até eu me surpreendo às vezes. Talvez sejam as letras tão diretas que falam exatamente aquilo que eu precisava ouvir. Talvez seja o piano ritmado e tão bem casado com o resto da melodia. Talvez sejam os “Oooooooh” libertadores posicionados ali em pleno refrão. A questão é que eu não consigo não cantar sem fechar os olhos bem forte e entoar os versos como se fossem o hino nacional, com a mão no peito e tudo. Pra mim são a trinca coração do disco.

When I Get Famous é puro Jamie, daquelas pra cantar com um sorriso maroto nos lábios, rindo dos outros, rindo de si mesmo, de preferência com uma dancinha improvisada bem ridícula. A falsa introdução dramática, a letra sacana (no bom sentido), o ritmo impossível de ficar parado, o solo de piano moderninho no meio... Se há alguns anos ele anunciava que queria mesmo era ser uma estrela do pop, essa é a hora de jogar na cara de quem um dia o desdenhou! E o que dizer da ironia dos últimos versos “Cause when I'm looking from the top/ You'll all seem smaller/Ain't that what all us humans want?/To stand that little bit taller” vindo de alguém com só 1,64 metros?

Anyway é a delícia de pop escondida na metade do álbum em que absolutamente tudo funciona. Cool na medida certa, com um refrão que vai se infiltrar na sua mente, a música podia até estar num CD no Bruno Mars (esse novo pelo menos), não fosse a letra esperta que não só fala sobre o tempo como reflete um pouco da própria trajetória de Cullum, sempre à procura da batida perfeita, fazendo letras com piadas (vide When I Get Famous) para o terror dos puristas de plantão. Verso matador: “Always remember that the terrorists of time, well they ain't friendly” (e não só porque tem “terroristas” no meio).

Pure Imagination, música do Willy Wonka, composta pelo sogrão do Jamie (veja só, o mesmo de If I ruled the World!), podia ter entrado somente nas bônus e deixado espaço para Momentum (que, afinal de contas, dá nome ao disco. Jamie Cullum é desses...), mas ficou tão legal, que eu nem me esquento.

Completam o time: The Same Things (jazz moderno, Jamie e sua filosofia de bar), Edge of Something com toda a sua pinta de tema de James Bond (profético!), grandiosa a la Skyfall, a animada Take me Out (falando sério, a essa altura da vida, a gente não precisava de uma letra como Take me Out, mas a música é boa) e tão tranquila que parece canção de ninar Get a Hold of Yourself (uma delícia!).

Nas bônus, além da já comentada Momentum (talvez o hino da fase thirtysomething do Jamie), temos  a sonífera Unison (originalmente da Bjork, tinha que ser!) em que Jamie canta sobre como nunca pensou em se comprometer e um cover bacanudo de Comes Love.

Uma das coisas que eu mais admiro em Jamie é a sua capacidade de não se repetir, sem nunca deixar sua verdadeira personalidade. Ele está sempre se desafiando. E nos desafiando. E acrescentando elementos à sua música. (Amo Bublé, mas acho um desperdício que ele se limite a interpretar clássicos e agradar a sua plateia mais idosa, já que eles é que compram os CDs).

Ao mesmo tempo em que está igual, também está diferente. Ao mesmo tempo em que está diferente, está melhor. A intensidade das letras lembram os tempos de TwentySomething, as melodias contagiantes aperfeiçoam o que Catching Tales tinha de melhor. Após The Pursuit, que não tinha exatamente um tema fixo, Momentum vem com um Jamie Cullum falando sobre tempo, idade, sonhos, escolhas e com tudo isso aí, colega, pelo menos, para essa ouvinte daqui, o jogo já estava ganho.

*A única coisa que eu acho que Jamie ficou devendo foi uma música especialmente feita para as filhotas, falei. Mas talvez Momentum seja uma homenagem disfarçada...


Keep going, Mr. Cullum! Keep going!

E já tem 7 anos que eu venho esperando pra ver esse cara ao vivo. E se Jamie Cullum não vem mais à montanha, talvez seja a hora da montanha ir à Jamie Cullum. Quero cantar Save Your Soul com os olhinhos fechados, fazendo air piano. Quero pular sem parar ao som de Mixtape. Quero fazer minha dancinha pra participar do Video Project em When I get famous. Quero ver a corridinha de TwentySomething. Já nem faço mais questão do Mind Trick no set list. Pra você ver como eu gostei desse novo disco.


Imagina eu lá! Sério, Jamie, vem pra cá, garoto!
Continue lendo...